Matéria do Mês de Fevereiro (2010)
RETRIBUIÇÃO AOS DÉBITOS DE GRATIDÃO
(Brasil Seikyo, edição nº 2021, 30/01/2010, página B1.)
“Se a benevolência de Nitiren for realmente grande e abrangente, o Nam-myoho-rengue-kyo propagar-se-á por dez mil anos e mais, por toda a eternidade, pois esta (a benevolência de Nitiren em propagar o Nam-myoho-rengue-kyo) possui o poder benéfico de abrir os olhos cegos de todos os seres vivos do Japão e de bloquear a estrada que leva ao inferno de incessante sofrimento.” As Escrituras de Nitiren Daishonin, vol. 4, pág. 91 (Explanação do presidente Ikeda, Terceira Civilização, edição no 495, novembro de 2009.)
Resumo e cenário histórico:
Retribuição aos Débitos de Gratidão é um dos dez escritos mais importantes de Nitiren Daishonin. Datado de 21 de julho de 1276, pouco mais de dois anos após Daishonin ter se retirado para o Monte Minobu, foi motivado pela notícia da morte de Dozen-bo, o sacerdote chefe do templo Seityoji, na província de Awa, mestre de Nitiren Daishonin quando ele ingressou no templo ainda menino, com doze anos. Logo após receber a notícia, Daishonin escreveu este tratado como uma expressão de gratidão a Dozen-bo, e o enviou a Joken-bo e Guijo-bo, seus antigos seniores em Seityoji que, posteriormente, tornaram-se seus seguidores. Daishonin anexou uma mensagem, instruindo-os a lerem o texto em voz alta diante do túmulo de Dozen-bo.
Em 1233, Daishonin havia ingressado no templo Seityoji para estudar o budismo com Dozen-bo como seu mestre. Naquela época, os templos seriam como centros de conhecimento e de religião. Mais tarde, aos trinta e dois anos de idade, Daishonin retornara ao templo Seityoji após mais de dez anos de estudo em templos de Quioto, Nara e outros principais centros de ensino budista. E, na manhã do dia 28 de abril de 1253, Nitiren Daishonin recitou pela primeira vez, a Lei suprema, o Nam-myoho-rengue-kyo.
Na parte inicial dessa carta, Daishonin afirma que as pessoas que estudam o budismo deveriam pagar seus débitos de gratidão para com os seus pais, mestres, os três tesouros do budismo e soberanos. Ele enfatiza a importância de saldar a gratidão como um aspecto fundamental do comportamento humano. Em seguida, declara que para se pagar tal dívida, a pessoa deve dominar a verdade do budismo e atingir a iluminação, praticando o ensino budista correto.
Em sua explanação, o presidente da SGI, Daisaku Ikeda, afirma: “O ato de reconhecer as dívidas de gratidão é característico do espírito do budismo, que visa cultivar a mais rica humanidade possível. Saldar as dívidas de gratidão é próprio de uma vida sábia, capaz de vencer a escuridão ou a ignorância mais profunda. Por isso, a vida dos praticantes budistas genuínos sempre resplandece com a luz interior do reconhecimento e da gratidão”.
Em outro trecho, ele descreve: “A revelação dos Três Grandes Ensinos Fundamentais(1) pode ser interpretada como uma forma de Daishonin saldar completamente a dívida de gratidão para com os pais, todos os seres vivos e a nação. Esse fato também pode ser visto como um revigorante ponto de partida na vida de Daishonin para a realização do Kossen-rufu mundial — o meio de saldar as dívidas de gratidão à humanidade e ao mundo. Dessa forma, a vida inteira de Daishonin foi uma grande epopeia para saldar as dívidas de gratidão”.
Explanação:
Esta frase consta na parte final deste escrito na qual Daishonin declara que o seu ensino é tão profundo que salvará as pessoas pelos dez mil anos dos Últimos Dias da Lei e mais, por toda a eternidade. Esclarece o imensurável benefício do Nam-myoho-rengue-kyo dos Três Grandes Ensinos Fundamentais, a grande Lei para a iluminação de todas as pessoas a ser propagada no futuro eterno.
Na explanação deste escrito, o presidente Ikeda faz as seguintes observações:
“O que levou Daishonin a revelar o Nam-myoho-rengue-kyo, foi sua atuação repleta de benevolência para identificar e propagar o ensino correto. Nisso, vemos a monumental convicção do Buda de que, em resposta a essa determinação profunda, o Nam-myoho-rengue-kyo se propagaria e conduziria a humanidade à iluminação, pelo infinito futuro dos Últimos Dias.
“Nesse trecho também são salientadas as três virtudes de Daishonin: as virtudes de soberano, mestre e pais. ‘Se a benevolência de Nitiren for realmente grande e abrangente’ indica a virtude de pais; ‘possui o poder benéfico de abrir os olhos cegos de todos os seres vivos’ representa a virtude de mestre; e ‘bloquear a estrada que leva ao inferno de incessante sofrimento’ é a virtude de soberano.
“A virtude de pais representa a função de nutrir e cuidar das pessoas. Daishonin conseguiu estabelecer a Lei suprema para a iluminação de todas as pessoas visando ao futuro infinito dos Últimos Dias, precisamente porque ele mesmo enfrentou e venceu inúmeras adversidades e perseguições.
“Essa benevolência grandiosa e abrangente mencionada neste trecho não se manifestou em condições sociais pacíficas e tranquilas. Foi durante uma época imersa nos três venenos — avareza, ira e estupidez (2) — e enquanto lutava contra os três poderosos inimigos (3) do budismo que ele iniciou o movimento do Kossen-rufu pelo bem das futuras gerações. A profundidade e a amplitude da benevolência de Daishonin são incomparáveis.
“A virtude de mestre representa a função de conduzir as pessoas ao caminho correto. Na expressão ‘os olhos cegos de todos os seres vivos do Japão’, Daishonin naturalmente não está se referindo a uma deficiência física, mas à incapacidade das pessoas de reconhecer a natureza do Darma inerente por causa da ignorância ou escuridão fundamental. Ele mesmo deu exemplo de luta contra os três obstáculos e as quatro maldades (4) como devoto do Sutra de Lótus, com o objetivo de fazer as pessoas questionarem as convicções em crenças errôneas, despertando-as para uma filosofia de vida correta.
“A virtude de soberano representa a função de proteger os demais. Daishonin fala de ‘bloquear a estrada que leva ao inferno de incessante sofrimento’. Essa é a manifestação do profundo e irrefreável desejo de não permitir que uma única pessoa caia nessa condição de vida atroz. É impossível assegurar o bem-estar de todas as pessoas sem assumir o compromisso absoluto de erradicar o sofrimento e a miséria da face da Terra.
“Não nos esqueçamos de que Daishonin demonstrou com a própria vida as três virtudes — soberano, mestre e pais — por meio de uma batalha férrea e incondicional para propagar o ensino correto na era maléfica dos Últimos Dias da Lei.
“Herdeiros do espírito altruísta de Daishonin, os mestres Tsunessaburo Makiguti e Jossei Toda levantaram-se para concretizar o ideal do Kossen-rufu na sociedade. Graças ao surgimento da Soka Gakkai — uma organização dedicada a realizar o desejo ou o decreto do Buda —, o ‘grande rio do Kossen-rufu’ que tem em Nitiren Daishonin a fonte, flui poderosamente pelo mundo inteiro, no século 21. Isso é um fato inquestionável. Já estabelecemos por completo as bases do Kossen-rufu mundial. Chegou, enfim, o momento de estender este grande rio e convertê-lo num ‘oceano do Kossen-rufu’ que envolva o globo.”
Nitiren Daishonin continuou a recitar Daimoku e a ensinar aos outros essa prática “sem poupar a voz” durante toda a sua existência, avançando pelo caminho de sua missão para propagar a Lei Mística nos Últimos Dias da Lei. Seus esforços para bradar e propagar o ensino correto, sem reservas, simboliza o espírito de “não poupar a própria vida”. Neste contexto, o presidente Ikeda nos orienta que não podemos nos limitar a apenas recitar Daimoku individualmente, sem incentivar os outros a fazerem o mesmo, pois desta forma não atingiremos a ampla propagação da Lei entre as pessoas desta época cheia de sofrimentos, conhecida como os Últimos Dias. Ele ainda diz que não haverá transformação na vida das pessoas a menos que elas vençam a ignorância ou escuridão que possuem inerente e ensinem outros a fazerem o mesmo.
Palavras e frases:
(1) Três Grandes Ensinos Fundamentais (ou Três Grandes Leis Secretas): Princípios centrais do ensino de Nitiren Daishonin. Eles são: o objeto de devoção do ensino essencial; o Daimoku do ensino essencial; e o santuário do ensino essencial. São assim chamados porque estão implícitos no texto do 16o capítulo do Sutra de Lótus, “Revelação da Vida Eterna do Buda”, e permaneceram desconhecidos até que Daishonin os revelou.
(2) Três venenos (avareza, ira e estupidez): Males fundamentais inerentes à vida que originam o sofrimento humano. Na obra “Tratado sobre a Grande Perfeição da Sabedoria”, de Nagarjuna, os três venenos são vistos como a fonte de todas as ilusões e desejos mundanos. São assim chamados porque contaminam a vida das pessoas e as impedem de voltar o coração e a mente para o bem.
(3) Três poderosos inimigos: Três tipos de pessoas arrogantes que perseguem os que propagam o Sutra de Lótus na era maléfica posterior à morte do Buda. São descritos no trecho em verso de vinte linhas, que consta no 13o capítulo do Sutra de Lótus, “Devoção Encorajadora”. O Grande Mestre Miao-lo, da China, classifica os três poderosos inimigos em: (1) leigos arrogantes; (2) sacerdotes arrogantes; e (3) sábios falsos e arrogantes.
(4) Três obstáculos e quatro maldades: Vários obstáculos e impedimentos à prática budista. São classificados no Sutra do Nirvana e no Tratado sobre a Grande Perfeição da Sabedoria, de Nagarjuna. Os três obstáculos são: (1) o obstáculo dos desejos mundanos, que surgem dos três venenos — avareza, ira e estupidez; (2) o obstáculo do carma, ou resistências derivadas do mau carma criado por ter cometido algum dos cinco atos malignos ou dos dez maus atos; (3) o obstáculo da retribuição, causados pelos efeitos cármicos negativos de ações cometidas nos três maus caminhos (estados de Inferno, Fome e Animalidade). As quatro maldades são: (1) o impedimento dos cinco componentes ou obstruções causadas por nossas funções físicas e mentais; (2) impedimento dos desejos mundanos ou obstruções causadas pelos três venenos (avareza, ira e estupidez); e (3) impedimento da morte, devido à própria morte do praticante ou à morte prematura ou intempestiva de um seguidor, gerando dúvidas nos demais; e (4) impedimento do Rei Demônio do Sexto Céu, função destrutiva que se vale de diversas pessoas e circunstâncias para fazer com que o praticante budista abandone a fé. É considerado como o impedimento mais difícil de ser superado.